Sentámo-nos com o CEO da IAD Portugal para falar sobre o que a revolução digital trouxe ao mercado imobiliário e as novidades da rede para 2022.
Alfredo Valente está hoje à frente da IAD Portugal, a maior rede de consultores imobiliários independentes no país, nesta que foi a primeira experiência internacional da marca francesa.
Aqui, falou-nos dos planos de expansão, de como a tecnologia facilita as relações humanas e da necessidade de pensar. Com as suas bases na sociologia, equilibra o que é a necessária digitalização e relação presencial, neste que é um negócio que ainda se fecha de olhos nos olhos.
Como foi a evolução da Rede IAD nestes últimos 5 anos pra cá, em Portugal, e de uma forma geral, internacionalmente?
Em Portugal tem sido uma aventura incrível. Quando eu cheguei à IAD, éramos a única experiência internacional IAD, por isso, a primeira exportação do modelo para fora de França. Isso marca, indelevelmente, a primeira metade da minha experiência com IAD, pois as dificuldades de operacionalizar o modelo eram muito grandes, sobretudo internas.
No 1.º ano era impossível inserir uma angariação ou fechar uma transação, porque os sistemas não estavam adaptados a funcionar fora de França. Para o final de 2018, o grosso do trabalho estava feito, apesar de andarmos sempre a tentar evoluir os sistemas. As bases estavam criadas e foi a altura em que a rede começou a crescer e profissionalizar-se, em qualidade e quantidade.
Hoje em dia, estamos num ponto de viragem, em que deixamos de ser de média dimensão e começamos a ser uma de grandes dimensões. Neste momento estamos com 740 consultores em Portugal.
Desde esse tempo, nota uma efetiva evolução tecnológica?
Nós temos uma grande preocupação com a qualidade do serviço que prestamos ao cliente, mas há aqui um cliente interno, que é a rede de consultores e a experiência deste utilizador, que também é fundamental. Quando digo que nasce de dentro para fora, é em relação justamente a esta tecnologia que fornecemos aos nossos consultores. Em função disso, eles conseguem entregar um melhor trabalho ao cliente final.
Claramente, hoje em dia, o valor da componente tecnológica é muito valorizado, com vídeos em HD, visitas virtuais, fotos profissionais e a capacidade que o consultor tem de perceber o que o cliente quer ver, com base nos dados.
Está em curso uma verdadeira revolução, mas acho que estamos apenas no início. Aqui, a CASAFARI e todas as plataformas de data e IA conseguem ver que estamos no início desta digitalização.
Essa evolução é clara no digital, mas ainda estamos uma primeira fase?
A legislação que temos é um pouco castradora. Por exemplo, a regulamentação sobre as escrituras por videoconferência tem poucos meses. A legislação ainda nos obriga a qualificar uma assinatura digital através de uma chave-móvel ou certificado digital. Há uma parte da revolução tecnológica que depende puramente do legislador, sendo mais demorada.
O resto depende muito de nós, mas vemos à nossa volta este ecossistema da mediação uma série de Proptechs, Fintechs e muita capacidade criativa. A IAD foi criada em 2008, não havia Spotify, nem Airbnb, só para nomear alguns. Em 13 anos mudámos radicalmente a forma de fazer negócio, fomos os primeiros a fazer mediação imobiliária sem uma rede física de agências. Acho que nos próximos 6 anos o mercado imobiliário vai mudar radicalmente. Aqui, queremos trazer a simplicidade e leveza no processo, como hoje em dia se aluga uma casa para passar férias.
A IAD tem um papel de disrupção no que toca à tecnologia deste mercado imobiliário que era tão analógico há uns anos?
Hoje em dia já há muita gente a introduzir inovação, mas acredito que estamos um passo à frente, a desenvolver a tecnologia de “depois de amanhã”, porque a de amanhã já está criada. Dizemos muito isso. Essa capacidade de encontrar o que quebra com a lógica das rotinas instaladas é o verdadeiro desafio e um dos componentes do nosso ADN.
O que há de diferente nessa tecnologia do “depois de amanhã”?
É verdadeiramente focada na experiência do utilizador. Nunca vai deixar de ser um negócio que se fecha entre duas pessoas, uma que vende e outra que compra. Acredito que isto nunca vai mudar na mediação imobiliária.
Por isso, tudo tem que ser focado na experiência desses componentes do negócio. Nós olhamos muito para a experiência do nosso consultor, tudo tem que ser fácil e ligeiro. O que fazem agora pela da difusão massiva e automática, há dois anos não existia. O cliente vendedor e comprador ainda não tira partido completo dessa revolução tecnológica, pois ainda há muito estrangulamento regulamentar.
De que forma é que vê essa relação digital-presencial a acontecer no mercado imobiliário?
Nós podemos achar que é uma transação hiper-racional, pois normalmente é a maior aquisição da vida da pessoa, mas é uma compra que tem muito emocional, que vem com aquela sensação física de quando entramos numa casa e pensamos “essa é a minha casa”, por isso fecha-se sempre presencialmente e acho que assim vai continuar.
Até lá, conseguimos evitar visitas que “não se justifiquem” com recurso a tecnologia. Depois disso, trabalhamos para facilitar o inferno burocrático que o comprador tem pela frente. Temos que simplificar.
Em 2021 previu a expansão da IAD para os EUA. Como está este processo?
Infelizmente a covid veio atrapalhar esse objetivo. Durante muitos meses, nem sequer foi possível viajar até os EUA, dito isto, avançou o que podia e agora, está tomada a decisão de que vamos expandir para os EUA como um continente e não um país. Vamos conquistar Estado por Estado. O primeiro provavelmente será a Flórida, por várias razões, sendo uma delas a proximidade com o México, onde já estamos desde 2020. A partir daí, abrangemos progressivamente outros Estados até termos uma posição estratégica importante.
É um mercado imobiliário que tem muitos atores disruptivos, muito mais do que na Europa, já que o velho continente é muito mais conservador nesta área. É um processo que está a avançar em bom ritmo. A concretização muito provavelmente acontece este ano.
Há alguma novidade da IAD que queira partilhar connosco?
Aqui em Portugal vamos estar com uma enorme campanha de ativação de marca, de um investimento gigantesco, a partir de abril. Recentemente, inaugurámos as nossas novas instalações, Avenida da Boavista, no Porto.
Em termos internacionais, alavancar a expansão internacional, para além da expansão dos EUA. Uma outra aposta muito grande foi a criação de um departamento, o IAD studio, que é precisamente onde nós fazemos a reflexão sobre as ferramentas de amanhã e vamos ver coisas revolucionárias a sair até ao final de 2022, para entregar ao mercado imobiliário.
Em 2021, a IAD anunciou quebra de recordes de faturação. Como é crescer num momento pandémico?
Do ponto de vista da operação, foi positivo. Por um lado, na IAD (que significa “Imobiliário Ao Domicílio”), nasceu para trabalhar a partir de casa, por isso, quando ficámos confinados, não nos afetou em termos de logística.
A partir do momento em que foi possível continuar a transacionar imóveis com alguma normalidade, foi francamente favorável para nós e 2021 foi um ano extraordinário. Fechámos o ano fiscal e crescemos de 6 milhões de euros para 10 milhões de euros de 2020 para 2021. Este ano de 2022 estamos em vias de fechar com 16 milhões de euros, portanto ainda um crescimento de 60%.
Isto tem que ver com duas coisas, o crescimento no mercado imobiliário – para não crescer no mercado português é preciso fazer um muito mau trabalho – e, por outro lado, a eficiência interna. A taxa de conversão em angariação está muito maior e os compradores estrangeiros também têm sido uma componente significativa para o volume de negócio, acima dos 200.000 euros, que compara com os 160.000 euros da média de mercado. Resumindo, mais transações e a valor superior.
No LinkedIn escreveu que desenvolveu um “sexto sentido”. Qual é a importância que lhe dá na área do imobiliário?
Tem o seu quê de intuição, mas é fundamentalmente técnica. Comecei há muitos anos na Banca e é dessa escola que nasce o meu sexto sentido, porque era um trabalho mais intuitivo que técnico, visto que éramos confrontados com centenas de negócios diferentes, que nos passavam pelas mãos todos os dias. Eu cresci profissionalmente ao analisar e discutir modelos de negócio diferentes, possibilitando-me hoje olhar para o negócio com noção de intuição e técnica.
Na minha vinda para a IAD, como expliquei anteriormente, o arranque foi muito difícil. Foi preciso perceber o que nos estava a acontecer, como se ultrapassava, e eu continuo a trabalhar assim, identificando os desafios e vendo como podemos ultrapassá-los.
Aplica-o nos talentos que procura para a IAD?
É fundamental que se procure um talento, mais do que as skills. Nós fomos criados para desenvolver as competências técnicas para depois vendermos isso ao mercado de trabalho. Agora é completamente obsoleto, porque a skill técnica adquire-se sempre.
Durante anos fiz sobretudo coaching para empresários, onde o meu conselho foi sempre: se tem alguma pessoa com a qual se identifica, contrate-a, ela vai sempre acrescentar. Uma equipa que não choque e não discuta, não é verdadeiramente uma equipa, e vai desenvolver o negócio de forma mais lenta. Se há uma pessoa cujo nível de energia e talento me interessa, ela vem para a minha equipa. Fazer o quê, vemos depois. É positivo ter alguém que partilhe da perspetiva e traga uma outra visão, numa discussão à volta de um projeto.
Nós tendemos a repetir processos por acharmos que “já sabemos o que fazer”, e precisamos de pessoas ao lado que nos dêem novos horizontes. É preciso humildade para liderar e dar espaço ao talento. A visão é feita de contributos, e quando achamos que já sabemos de tudo, temos que evitar criar bloqueios e não comprometer o futuro.
Do coaching à liderança e gestão de equipas, como é que uma licenciatura em Sociologia o ajuda a desenvolver as skills que usa hoje no negócio?
Quando digo que estudei Sociologia, a maior parte das pessoas dizem que não tem nada que ver com o que faço agora. O bom efeito, para mim, foi aprender a pensar, da História, Filosofia, Psicologia, ao Direito.
Esta abertura ao problema e ao desafio, a cultura da reflexão, trago-a comigo até hoje e não quero que acabe. Tenho esse sexto sentido e defino-me como um generalista. Eu não sei nada em particular, “muito a fundo”.
Os especialistas dão-me 10 a 0, mas sou francamente competente enquanto generalista e acho que isto vem da minha experiência académica, esta orientação para a reflexão e não para a tarefa.
Considera que falta pensar?
Considero, falta pensar e especular, discutir ideias. Falta tempo. Acordamos de manhã e já temos três notificações e engrenamos nisso até tentar ir dormir um pouco. Falta filosofar. Se a tecnologia for libertadora, como eu acho que é, não nos pode escravizar. A tecnologia é para servir, para ser livre no exercício da sua profissão.